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Vítor Sarmento

Ex-presidente da CONFAP

Boa tarde a todas e a todos. Já percebemos que esta é uma discussão que vai demorar muitas horas. Não é propriamente uma discussão, é mais uma conversa, é uma partilha de informação que demorará tempo.

Eu estive no MAP onze anos e meio. O meu filho foi para o 1º ciclo em 1992 e a partir de janeiro/fevereiro de 1993 criámos nessa escola a associação de pais e em 1995 lembro-me de ter participado na primeira iniciativa da CONFAP. Participei no MAP até 2004. Cessei funções quando o meu filho foi para a faculdade. Tenho excelentes memórias desses anos. Tenho particularmente memória do período conturbado que vivemos. Havia vários motivos.

Começo por dizer o seguinte: a história do Movimento de pais começou antes das associações, porque antes do 25 de abril, houve pais que começaram a organizar-se por razões concretas de problemas escolares e, depois do 25 de abril, outros pais se movimentaram, já por outros problemas. As associações começaram a tomar forma entre 1976/77, e só quando lhes foi dado um estatuto mais tarde, formou-se o SNAP (Secretariado Nacional das Associações de Pais). Eram 4 as estruturas regionais que iniciaram este processo. É bom não esquecer que, não puxando a brasa à FERLAP, fui seu Presidente durante três anos, mas foi de facto a FERLAP a primeira federação regional de associações de pais que se organizou em Portugal, apesar de muitas vezes serem discutíveis as suas posições.

É então mais tarde que foi criada a CONFAP. E organizou-se ainda com poucas federações regionais. Elas foram crescendo. Percebi hoje que algumas federações regionais estão pouco ativas, e esse, é um trabalho que tem de ser feito, talvez de forma militante, no meu entender.

É desta forma que eu penso que vai ser necessário continuar a ser, por muito que tenhamos pena, pois demonstra a grande falta de participação dos pais.

Temos de nos interrogar do seguinte: por que motivo entramos para a associação de pais? Egoisticamente, a primeira questão que se coloca é o nosso filho. Eu acho que isso vai ser sempre assim. Depois percebemos a dimensão da “coisa” e nessa altura decidimos se temos ou não temos vontade de ajudar a resolver os problemas gerais da escola. Mas o primeiro pensamento é o nosso filho, é por ele que lá estamos. Creio que algumas vezes, o problema é quando a nossa ação se centra única e continuadamente apenas no nosso filho. Quando entramos na AP temos de pensar em todos os alunos.

Perderia muitas horas a relatar-vos alguns factos por que passei no MAP. A história da sede:  para mim foi uma pequena “armadilha” montada, dado que a CONFAP tinha uma sede, que era na Rua Pinheiro Chagas, num 2º andar, propriedade do Ministério da Educação. Mas a determinada altura aconteceu o seguinte:

– O Ministério da Educação quis aquele andar e propôs-nos um negócio que fez com que acontecesse o que o Jorge já tinha aqui relatado, ou seja, deu-nos uma verba para servir de entrada num empréstimo que a CONFAP contraiu à banca para a compra de um novo andar. É claro, na altura, nós (CONFAP), tínhamos uma comparticipação financeira nula para as nossas atividades e nessa medida, a compra da sede era a melhor solução, mas tendo que usar verbas destinadas ao apoio à atividade. Assim, o ME retomou esse andar e nós conseguimos arranjar uma cave com um preço acessível perto da Praça do Chile.

Até o ministro da Educação, Augusto Santos Silva, foi à inauguração. Mas reconheçamos que esta sede não é bem a mesma coisa da que possuíamos.

Hoje é património da CONFAP e pelo que ouvi hoje, já percebi que está paga, mas na altura, fomos empurrados para esta a solução. E se bem me lembro, quando o banco viu que isto era uma associação de pais, ainda implicou um pouco.

O ano da inauguração da sede foi em 2000 e eu participava na direção em representação da FERLAP. A direção que eu presidi foi eleita em 2001.

A história era muito complicada, pois até 2001, o sistema eleitoral (os mais velhos sabem disso) era um sistema muito peculiar.

E essa discussão das federações regionais terem o peso de determinar é uma questão antiga e é um dos problemas que se coloca no Movimento Associativo de Pais. E eu acho que não há volta a dar. Já disse isto a muitos companheiros.

Cessei a minha função de presidente da CONFAP em 2003 e no ano seguinte fui presidente da mesa da Assembleia Geral e no final desse mandato cessei funções no Movimento Associativo.

Só tinha a solução de sair. A paixão acaba por nos tocar muito e isso é inegável. Ou cortamos ou aquele fio que depois percebemos que não é a mesma coisa, a nossa palavra, já não a conhecem, já não temos autoridade para falar. Eu optei pela solução do corte, saindo. Outros tomaram outra opção. Estive lá 11 anos. Conheci muita gente. Boa gente. Aprendi muito em matéria de educação, e não só.

O problema (e que vai ser sempre um problema) são as “fornadas” de pais que entram e as “fornadas” de pais que saem. E os dirigentes, por muito que se mantenham no Movimento Associativo depois é difícil passarem a história. Nessa altura já estamos noutra.

O meu tempo é de grandes “guerras”. Grandes “guerras” legais em 1998. Era a Lei do estatuto disciplinar do aluno, o decreto-Lei de gestão e administração das escolas. Era a falta de democracia na CONFAP.

Apesar de estarmos em funções regionais ou nacionas, defendo que não podemos perder as ligações às associações de pais das nossas escolas. Se o fazemos é um erro terrível.

Outra grande discussão nessa época tinha a ver com a estrutura da CONFAP e sabermos como nos estruturaríamos. Temos a base, que é a associação de pais. E depois temos as estruturas intermédias, que são as concelhias. No meu tempo tínhamos 30 concelhias. Quando saí em 2003 da presidência da direção, tínhamos algumas concelhias muito ativas como Sintra,  Amadora, Lisboa, Loures, V. Nova de Gaia, Gondomar e outras.

Aliás, Sintra inclusive, passou a gerir os dinheiros da Câmara de Sintra descentralizadamente para poderem gerir uma parte dos apoios aos ATL e às refeições que o Município dava para as escolas do primeiro ciclo.

Eu quando fui eleito pela primeira vez presidente da FERLAP em 1998, a primeira iniciativa que tomámos foi fazer uma petição ao Parlamento para que todas as crianças do 1º ciclo pudessem ter almoços em condições iguais aos dos outros ciclos de ensino, porque em 1985, descentralizou-se para as autarquias um conjunto de competências, entre as quais, a ação social escolar, só que não foram acompanhadas dos meios financeiros e isso levantou sérios problemas.

Dou-vos um exemplo caricato: um miúdo do 1º ciclo chegava a pagar 400 escudos por uma refeição (os refeitórios tinham que ser autossuficientes e, portanto, só almoçava quem pagava) e depois tínhamos os alunos do 2º, 3º ciclo e secundário, onde existiam refeitórios geridos a partir do Ministério da Educação em que pagavam 125 escudos e os ditos alunos carenciados, nada pagavam.

Esse problema, felizmente, foi, entretanto, resolvido.

Na altura a CONFAP, por razões que não vêm aqui ao caso, afastou-se um bocadinho desta batalha que foi conseguida, mas que ainda durou uns anos. Uma coisa que aprendi é que na educação demora tudo muitos anos.

E não é possível o Jorge Ascensão, daqui por 10 anos, (tal como eu estou a fazer neste momento), vir para aqui mandar umas “papaias”, porque a realidade é outra. Porque as coisas já não são iguais, sabendo que existem problemas que são estruturais.

As questões da importância da associação, da participação, eram assim, e vão continuar no futuro.

Eu parece-me que em 1976, quando alguns pais se começaram a estruturar, havia motivações. Havia razões. Não vale a pena apagar a história. Havia razões contra os perigos do que eles então consideravam da “marxização” do ensino. Havia um punhado de pais que entraram por este caminho. Claro que as coisas evoluíram, os pais alargaram-se e há pessoas que se calhar ainda pensam assim. Com toda a legitimidade.

Felizmente a história não lhes deu razão e, portanto, a coisa fluiu e temos outro tipo de problemas. E eu, sempre disse, mesmo na altura em que havia problemas sérios, tempo de várias clivagens, que é mais o que nos aproxima do que aquilo que nos separa. Porque ninguém quer, seja a, b ou c, para o seu filho o pior. Para o filho queremos sempre o melhor.

E como dizia o Zé Leitão, que presidiu à FEDAPAGAIA e foi ele que me ensinou esta frase: “– Nós queremos que os nossos filhos sejam escandalosamente felizes.” E dizia com razão.

Eu nunca estive preocupado se o meu filho tinha grandes notas. Eu queria que ele estudasse e se divertisse.

Ele hoje já tem 33 anos, trabalha em engenharia civil. Faz a sua vida, tem 2 filhos.

Ele foi feliz à sua maneira. É claro que se ele tivesse algum problema, nós lá estaríamos para o ajudar. Eu acho que é esta questão que todos nós queremos, de esquerda, de centro ou de direita. Mais refilões ou menos refilões, mas é isto que queremos. E isso aproxima-nos a todos. Depois há algumas questões que nos dividem, mas nessa matéria, promova-se o debate.

E, portanto, para não me alongar, continuo a pensar que há matérias que são coincidentes desde o período antes do 25 de abril, quando os pais se começaram a organizar, até ao presente, e são essas que temos de explorar.

Para acabar, o Jorge Ascensão colocou aqui uma questão, que é a do financiamento da CONFAP e tem alguma importância.

Acho que não esclareci bem o método eleitoral seguido durante muitos anos. Tentarei fazê-lo agora: Depois de eleita a primeira direção da CONFAP, as direções foram sendo eleitas por proposta da direção cessante, que apresentava 4 pessoas, que eram o tesoureiro, o presidente, o vice-presidente e o secretário. Esses é que eram eleitos. O resto da direção era composta por indicação de cada uma das federações regionais. E o sistema estava feito para dificultar a apresentação de listas concorrentes. Para se poderem apresentar, as listas tinham de ser subscritas por um mínimo de 10% do total das associações de pais de cada uma das federações regionais. Facilmente se percebe a dificuldade que isto criava à existência de outras listas. Era preciso ter um aparelho bem montado para ir do nordeste transmontano até ao Algarve para conseguir isto…

Portanto, nunca houve listas alternativas até 2001. E essa foi a batalha de alguns companheiros, na qual eu me envolvi, pelo menos desde 1994.

Conseguimos apenas em 2001 fazer essa revisão estatutária. Foram realizadas várias assembleias gerais. Mas conseguiu-se. Eu diria que fui o primeiro presidente da CONFAP por eleição direta, porque até àquele momento eu diria que era mais ou menos por sucessão.

Eu acho isto muito interessante, valia a pena estudar o que foi a experiência da CONFAP.

Valia a pena tentar conseguir que se perceba esse período, sem qualquer preconceito ideológico sobre todo o historial do Movimento Associativo de Pais, fazendo um relato desta história, que teve o seu curso. Passaram 45 anos e prova-se que há coisas menos bem conseguidas. Mas como já disse atrás, isto anda muito devagar.

É importante fazer uma história desapaixonada, sem preconceitos e tentar perceber como e por que motivo as coisas foram, tal como foram…

Talvez também valesse a pena encontrar duas ou três pessoas que assumissem o compromisso de juntar toda a informação possível e fazer o trabalho de compilação.

Por fim, ficam aqui as nossas intervenções, apaixonadas ou não. E eu fico muito contente de voltar aqui e estar este bocadinho a conversar convosco.

Na alteração de estatutos realizada em 2001, limitámos os mandatos das funções de presidente da CONFAP a dois anos. Mas poucos anos depois, creio que durante a Presidência do Albino, que me sucedeu na Presidência da CONFAP, mas com quem ainda trabalhei na direção a que presidi, em Assembleia Geral decidiram o contrário.

Continuo a pensar que é saudável existir limitação dos mandatos. Mas enfim. Liberdade de pensamento e muito obrigado.